Duncan
Hamilton - Acidente
Óleo sobre Tela
27x41 cm
"Chegamos
ao Porto na quinta feira à tarde e fomos directos para o hotel Infante de
Sagres. O meu Jaguar C type chegou nesse mesmo dia num navio de carga e Len
Hayden tratou imediatamente de o preparar. O carro tinha apenas dois
carburadores SU, em vez dos três Weber da versão Le Mans, mas não deixava de
ser rápido.
Fiz o melhor
tempo nos treinos e segundo a imprensa portuguesa era um sério candidato à
vitória. Os meus rivais eram o Lancia de Taruffi e os Ferrari de Casimiro de
Oliveira, Nogueira Pinto e Castellotti. Tony Gaze, em Aston Martin, também
teria uma palavra a dizer.
Apesar de
não ter feito uma boa partida, já vinha à frente na primeira curva, mas foi sem
surpresa que pouco depois vi um Ferrari 4.1 passar-me na recta. Eu tinha o
tanque cheio e o carro andava muito menos que nos treinos, mas apesar disso
tentei recuperar a minha posição por três vezes. Na terceira, ao chegar a uma
curva rápida na aproximação à marginal, tentei ultrapassar o Ferrari por
dentro. Os carros tocaram-se e ao tentar evitar um segundo toque perdi o
controle do Jaguar, que deixou a pista a 200 km/h apontado a um poste de
electricidade. Foi então que me lembrei de um conselho de Ascari quando ambos
estávamos na mesa de massagens em Le Mans: "Duncan, se algum dia tiveres
de bater, bate forte e de frente".
Assim
aconteceu, de facto. O poste ficou partido a meio e o carro foi catapultado
para o outro lado da pista em direcção a uma árvore, onde fiquei
"pendurado" por uns instantes até cair para a berma da estrada. Dois
indivíduos tentaram levantar-me, mas eu resisti. Sabia que tinha costelas
partidas e receava fazer uma perfuração de pulmões.
Quando
cheguei ao hospital lembro-me de estar estendido na mesa de operações e
verificar que não havia electricidade, porque o poste que eu derrubara era o
que fornecia corrente para o hospital. Junto a mim estava um homem enorme que
fumava charuto e tinha o que me parecia ser um avental de talhante e uma
ameaçadora faca na mão. Pedi água, mas ninguém entendia o que eu dizia, até que
apareceu alguém que sabia falar inglês e me disse que a água do hospital estava
contaminada e não podia ser consumida. Sugeriram que bebesse vinho do Porto, o
que aceitei com prazer para enganar a dor. Fui cozido sem anestesia, pois o
médico da especialidade tinha metido folga para assistir às corridas.
O balanço
final revelava nove costelas partidas, maxilar partido, uma vértebra fracturada
e vários ferimentos superficiais. Mas estava vivo."
Duncan
Hamilton
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